Terá o tempo sido gentil com esta trilogia? Ou eu?
Admito que emprenhei bastante de ouvido e papagueei as mesmas críticas, as mesmas bocas e até recusei explorar as sequelas – até agora. Sem grandes urgências ou impulsividades, consegui o resto da trilogia com bastante calma e através de um donativo de uma amiga. Como tal, senti-me com o dever moral de despachar e não pensar no assunto. E como não me recordava muito do primeiro, repeti-o para estar mais aberto ao resto da série. E foi a melhor decisão que tomei.
Final fantasy xiii
Lembram-se daquela revelação just one more thing durante a E3 de 2006? Pelo menos, acho que foi em 2006!, mas fiquei a delirar com o curto teaser do que viria a ser a nova protagonista e o sistema de combate rápido e fluído. Revendo o vídeo, nota-se que muito mudou, mas as bases estavam lá.
Em Portugal, o lançamento teve direito a um desfile de Cosplay que a minha companheira de então venceu para me oferecer o jogo. E joguei-o. E gostei. Também não gostei e não pensei mais na coisa até há uns dias.
Sem dúvida de que é um dos jogos mais controversos da série Final Fantasy, mas cada nova entrada o é, para o anterior ser perdoado. Só que muitos recusam-se a perdoar a trilogia XIII pelo que fez e/ou tentou fazer.
Como amante fervoroso dos combates por turnos, suspiro pelos clássicos que me deram a conhecer este estilo de combate mais zen, enquanto os novos abraçam uma acção em tempo real para cativarem os novos públicos. E nada contra; consigo desfrutar, tanto que o FFXV é um dos meus jogos favoritos! E anseio pelo FFXVI, mas uma pessoa sempre pode sonhar alto ou desbravar mil e um jogos do género que mantêm e refinam este estilo de combate que está longe de se extinguir.
Então, este FFXIII veio ser um intermédio entre os dois estilos: continua com os turnos, mas dá-lhe um toque de acção rápida porque está muita coisa a acontecer e não dá para parar.

Muitas das críticas (das minhas críticas) eram sobre a história; sobre a linearidade e sobre o combate. A história e a terminologia eram confusas!; os mapas eram só corredores!; o combate automático tirava a piada toda! Sim, mas também não.
Mais velho e com alguma maturidade, consegui compreender melhor os temas e, afinal, a história nem era assim tão confusa… E como é que a resumo? Assim: existem dois planetas, Cocoon e Gran Pulse. Em Cocoon, as pessoas vivem apaparicadas pelas entidades divinas fal’Cie (ou Sanctum fal’Cie) e são ensinadas a temer tudo o que vem do grande desconhecido e selvagem Pulse. O mínimo contágio deixa-as com COVID e passam a ser marcadas como l’Cie. O jogo abre com uma purga de possíveis contagiados por terem estado em contacto com um Pulse fal’Cie. Na verdade, os que foram mesmo contagiados recebem uma tatuagem catita e uma missão, ou Focus, bastante vaga. Se a cumprirem, ganham vida eterna em forma de cristal. Se falharem, ganham vida eterna em forma de figuras grotescas Cie’th. Preso por ter cão…
Ao longo dos treze capítulos, vamos tentar desvendar qual é o verdadeiro Focus do nosso bando para o cumprir ou se valerá mais a pena desafiar estes desígnios divinos. E aí estão os temas: o livre-arbítrio versus o seguir e cumprir o nosso destino, seja ele qual for. Existem outros, como relações, a capacidade de perdoar e saber crescer, mas cada um tirará as suas ilações. Mas consigo ver de onde vem a confusão: da quase homofonia da terminologia do jogo e só com o avançar das horas é que comecei a separar os conceitos.
Quanto à linearidade, consigo concordar a meio do caminho. FFX é só dos meus jogos favoritos e também é linear sem o tradicional mapa-mundo para explorar. O jogo pega numa peregrinação e leva-nos a eito do início ao fim, com alguma exploração pelo caminho, cidades e templos. O que serviu o propósito urgente da história. Já neste XIII, o elenco está em fuga constante e perseguido pelas forças especiais e militares de Cocoon. Existe uma exploração limitada, mas não existem as grandes cidades, tanto que acedemos às lojas através dos pontos de gravação. As poucas vezes em que temos liberdade para explorar acontecem em memórias ou quando as pessoas ainda estão ignorantes quanto à nossa condição. No entanto, existe um grande momento de Final Fantasy tradicional, mas deixem-me ser pseudo profundo:
Quero acreditar que a linearidade seja uma mecânica propositada porque o jogador, tal como os protagonistas, só tem um caminho a percorrer que é sempre a direito. Não existem desvios e a liberdade é uma ilusão, tal como os seus destinos. Só têm uma missão: a de destruir Cocoon e somos nós que os controlamos, como se fossemos um Sanctum fal’Cie distante e fora do jogo. Recusar ou deixar de jogar, equivale a uma vida eterna congelada no tempo. Perder é recomeçar momentos antes. Quando o jogo avança para os capítulos finais, quando aterramos em Pulse, torna-se num Final Fantasy tradicional, com um enorme mapa para explorar; criaturas a vaguear e as missões secundárias da praxe. Para mim, foi a parte menos boa do jogo porque, assim como as personagens, vi-me assoberbado com tanta liberdade. O que fazer. Como fazer. Para onde ir. Porquê. E eles debatem e desesperam com isto, até que decidem o seu próprio Focus e o jogo volta a ser linear.
Podemos escolher ver este jogo como preguiçoso ou como uma alegoria ao nosso fado e como podemos decidir as nossas vidas, acarretando com essas decisões. Quis pensar na segunda alternativa e consegui apreciar bem mais de FFXIII. Assim, como do elenco! Não são chatos nem queixinhas nem irritantes, gostei mesmo de todos, inclusive do Hope, que teve um bom arco de desenvolvimento. A Vanille é a definição de amor, o Sazh é o tipo fixe e com cabeça e o Snow é o Troy Baker. A Fang e a Lightning entranham-se. No final, criei bastantes laços com esta found family relutante e não consegui evitar umas lágrimazitas. Apenas não consigo dizer o mesmo dos vilões, apesar de reconhecer as intenções e a tragédia…

Por último, a polpa do género: o combate. O Auto Battle não é das melhores ideias, mas também não é das piores. É bastante útil naquelas batalhas mais chatas ou para treinar. É o equivalente ao martelar o X noutros jogos, mas vejo-o como a Tradução Automática na minha profissão. Serve o seu propósito limitado de agilizar o trabalho, mas irá sempre precisar do toque e do contexto humano.
Não é só carregar e esperar pelo melhor porque o jogo não sabe nem vai tomar as melhores decisões. No entanto, se começarmos as batalhas com Libra para analisar as vulnerabilidades e as resistências dos adversários, o Auto Battle irá ajustar-se às informações obtidas. Ainda assim, podemos ignorar a opção e seleccionar todos os ataques manualmente – mais será sempre mais e mais opções serão sempre benéficas. Sem mentir, devo ter passado 80% do jogo com esta mecânica.
Depois, o sistema de progresso Paradigm que assume o papel de Classes ou Jobs. Infelizmente, não podemos atribuir um papel a cada personagem individualmente, mas em trios. O que quer dizer que vamos ter de definir várias estratégias para cobrir todos os ângulos; o que também implica passar da ofensiva para a defensiva em segundos para prestar suporte e voltar a investir. É aqui que jaz o mencionado dinamismo, as batalhas não são estáticas, mas uma constante e recompensada adrenalina. Outro infelizmente, apenas gostava de ter um controlo mais individual sobre os restantes atacantes e não perder o jogo com a morte do líder.
Final Fantasy XIII é também um dos jogos mais belos da sua geração, uma dicotomia entre ambientes tecnológicos e orgânicos, com sequências de fazer cair o queixo: quando Snow irrompe na sua mota para salvar o dia; quando regressamos e rebentamos em Cocoon no brilhante capítulo 12; nos momentos mais calmos e nostálgicos das memórias – este jogo é tanto fogo de artifício como um domingo pachorrento e tem dos temas mais belos a acompanhar esses momentos. My Hands, durante os créditos, é a desculpa perfeita para chorarmos um pouco. Se o final do FFX me matou por dentro, este não lhe deve nada. Estou muito feliz por lhe ter dado uma segunda oportunidade e prometo que as próximas entradas não serão demoradas; esta foi só a abertura à jornada!
Final fantasy xiii-2
Acabei o Final Fantasy XIII-2. Sabem quando se enganam a escrever uma letra e calcam e recalcam por cima para emendar, mas só fica um borrão pior? É esta sequela, um jogo que quis emendar o que não estava errado na prequela, mas que acabou por borrar o pano e alimentar as bocas de que a trilogia XIII é má. Aprendi da melhor maneira que o XIII é mesmo um jogo muito bom e se acabasse ali, seria perfeito – agridoce, mas lindo…
Alguns momentos após o final de XIII, a Lightning desaparece e mais ninguém se lembra dela ali com o grupo, salvo a sua irmã. Todos juram que se sacrificou para salvar o mundo, mas a Serah é a única que sabe que a irmã está perdida algures. E esse algures é Valhala, uma dimensão no final dos tempos, onde Lightning combate eternamente contra Caius Ballad que quer destruir precisamente isso – o tempo.
No entanto, surge nos sonhos de Serah que a motivam a ir em seu socorro, acompanhada de Noel, o último humano e viajante do tempo, e Mog.
Senti que repetiu a premissa do anterior. Só que em vez corrermos contra o destino e desígnios divinos, lutamos contra o mesmo conceito, mas com um travo a viagens no tempo. Deixou de haver aquela urgência linear para termos todo o tempo do mundo, para o melhor ou pior. O que me leva ao próximo comentário: FFXIII-2 não me pareceu tanto um jogo, mas uma temporada de Doctor Who, com cada capítulo visto como um episódio tolo, onde as personagens vão até ao fim do mundo; retrocedem a passados e metem-se em alhadas temporais porque timey wimey wibbly wobbly; temos os Doutores e os companheiros, e até o Mestre.
Histórias que se metem com o multiverso ou viagens no tempo acabam por tropeçar, quase sempre, nos seus atacadores narrativos e este jogo não foi excepção com alguns acontecimentos melhor explicados com um aceno e sorriso, porque pouco faz sentido.

Esta sequela veio responder às críticas: trocou os corredores por cenários maiores para investir na exploração e na interacção, mas achei a progressão pior, com um backtracking disfarçado de rever os mesmos locais, mas noutros tempos. Por vezes, não era tão intuitiva e só um guia para me orientar. Ainda na progressão, não sei o que andaram a fazer no Crystarium, mas estava piorzito, assim como o desenvolvimento do equipamento. Já o combate estava mais fluído e sempre viciante, agora com uma nova mecânica de Pokémon, onde capturávamos os cristais das criaturas para nos acompanharem. Também estava mais interactivo com algumas QTE, assim como nas animações com mais acção.
Apesar de inferior (menos em visuais e banda sonora porque uau, aquele tema final!), não se preocupem muito com a história e desfrutem do fanservice porque esse esteve no ponto. As novas personagens e, desta vez, incluo o vilão nos elogios, foram do melhor. Gostei de conhecer e explorar a Serah que é o oposto da irmã carrancuda. E se gostei muito do Hope na prequela, ele aqui está impecável. Um dos verdadeiros heróis desta saga e com um desenvolvimento lindo.
Por outro lado, também foi dos jogos com pior desempenho porque as versões para PC saíram lastimáveis. Aliando isso a uma história inferior, não senti nem vontade em explorar os outros finais dos paradoxos nem os DLC dos episódios que envolviam algum grind. Dito isto, gostei bastante do início e do final; e agora fica a faltar o Lightning Returns: Final Fantasy XIII. Vamos?
Lightning Returns: Final Fantasy XIII
Um dos últimos jogos terminados em 2022. Uma entrada estranha, e que pensava que seria a pior. Por não ter engraçado com o XIII-2, não estava com grandes esperanças para este jogo, ainda por mais quando falavam mal da mecânica de tempo – é castradora; não deixa jogar à vontade; entre outras ansiedades. Só que também joguei o Majora’s Mask e o primeiro Dead Rising; já estava quase vacinado. E para dizer a verdade: gostei bastante e o tempo foi um dos aspectos mais generosos do jogo, tendo acabado com dias de sobra para andar a passear e a completar o máximo possível. Se podia saltar logo para o final? Até podia, mas iria perder bastante deste jogo, cujos detalhes contam imenso para os temas e desfecho da trilogia.
LR decorre uns 500 anos depois de XIII-2 e 13 dias antes do fim do mundo. Apesar de os calendários avançarem, o tempo congelou para as pessoas que deixaram de envelhecer. Longe de imortais, continuam a padecer de doenças, acidentes ou outros, só que estão praticamente congeladas num limbo à espera do fim dos dias. Estes chegam, assim como a Lightning que terá 13 dias (14, se forem dedicados, mas shhh) para salvar o máximo possível de almas e, assim, recuperar a sua irmã num novo mundo criado por deus, Bhunivelze. Em suma, a última sequela é a sequela das sidequests, MAS… estas são muito boas, com alguma profundidade e introspecção. Óbvio, também com bastantes fetch quests que podem ser despachadas durante uma sessão normal.
O detalhe que me fez chorar foi a mudança do sistema de combate. Quer dizer, passei dois jogos a apaixonar-me pelo Auto Battle e agora trocam-me as voltas com um novo sistema de Schemata – que é uma forma mais requintada de dizer que foram repescar e actualizar a mecânica das roupas do Final Fantasy X-2 para personalizarmos os Jobs da nossa única personagem, a Ligtning. E se comecei por não gostar da ideia, lá se me entranhou porque não diferia muito das prequelas. À medida que desbloqueamos mais roupas, armas, escudos e acessórios (alguns com um bonito fan service) temos a tripla liberdade de criar uma verdadeira besta de combate. Tripla porque, assim como os paradigmas, podemos alternar entre três fatos no momento para darmos resposta à situação. É bastante fácil quebrar o jogo e nem é preciso ir ao grind, basta jogar normalmente.

E o jogar normalmente também nos recompensa com uma enorme e longa masmorra adicional para testarmos as nossas habilidade. E eu, sendo um perfeito nabo, abria pelos andares como uma faca quente em manteiga durante o verão. Só não cheguei ao final porque fiquei sem dias e fui obrigado a avançar para a conclusão. Uma nota sobre este jogo e sobre os anteriores: esta trilogia tem dos melhores e mais empolgantes bosses finais. Os Bahamut do XIII-2 fizeram-me suar copiosamente do bigode, mas este foi outro nível – um literal culminar com o poder da amizade para terminar, não em grande, mas placidamente. Uma bonita despedida a uma trilogia a que cheguei tarde, mas também mesmo a tempo.
Lightning Returns: Final Fantasy XIII, a par com as prequelas, continua a ser um jogo belíssimo, não falha na banda sonora nem no fan service. É um jogo para os fãs do primeiro XIII e uma lição de reaproveitamento de recursos para criarem experiências inesquecíveis que remetem para a trilogia de lançamentos na era da PSX. Também é uma história de redenção e de descoberta; e uma remasterização para as novas consolas já tarda.
Obrigado por terem lido até aqui!