Sete anos separam Arkham Knight de Gotham Knights. Se quiserem uma comparação mais justa, podemos afastar-nos da trilogia produzida pela Rocksteady Games e olhar para o próprio catálogo da WB Games Montreal. Nove anos separam Arkham Origins de Gotham Knights, uma eternidade na indústria dos videojogos, duas gerações de consolas e toda uma panóplia de avanços formais e tecnológicos entre dois projetos que não podiam estar mais distantes um do outro. Na sua defesa, Gotham Knights não é uma continuação da saga que terminou em 2015, mas sim algo novo, agora focado na família de Bruce Wayne e não no Homem Morcego, numa campanha que se constrói sobre funcionalidades e sensibilidades mais modernas, com as missões a procurarem estabelecer uma ligação entre as quatro personagens jogáveis e a sua demanda para resolver o mistério em torno do falecimento de Batman, mas também a defesa de uma Gotham mergulhada num caos absoluto.
O que me surpreende em Gotham Knights é a sua banalidade, do mais medíocre que joguei em 2022, ao ponto de ser não só previsível na sua narrativa, como nas mecânicas que traz para um género já cansado e desprovido de novidades. Gotham Knights é tão seguro que me arrisco a dizer que nos faz repensar como adaptamos Batman e a sua família de justiceiros aos videojogos. Parece que recuámos no tempo e é difícil ver a WB Games Montreal num jogo cujas primeiras horas são dolorosas pela enchente de informações, missões arcaicas e falta de imaginação nos desafios que encontramos enquanto tentamos abandonar o legado das personagens no mundo dos videojogos. Vou ter de ir mais longe. Gotham Knights parece ser um trabalho encomendado e sem um pingo de investimento pessoal, como se fosse um lançamento para garantir os direitos sobre o IP e não uma tentativa sincera em criar uma nova série capaz de acompanhar The Suicide Squad, que chegará ao PC e consolas já no próximo ano. Como está, Gotham Knights é um produto estranho, regurgitado, feito para satisfazer um público tão vasto que acaba por ser apenas ruído branco para a maioria dos jogadores que aceitarem enfrentar a sua campanha de frente.
Se gostam de Gotham Knights e conseguiram encontrar alguma satisfação na sua progressão e na forma como a campanha se constrói sob a repetição de missões menores para desbloquearmos os casos principais – obrigando-nos a patrulhar as ruas de Gotham em busca de pistas e recursos até desbloquearmos a informação que nos permite seguir em frente -, fico feliz por vocês. Gotham Knights é o tipo de videojogo que foi criado para encontrar um público, seja ele qual for, e não desejo nenhum mal à WB Games Montreal, mas também nunca fui fã de bolachas sem sal e é isso que encontro aqui. As missões secundárias, onde temos de parar assaltos ou interrogar suspeitos – entre outras, como o desmantelamento de bombas e a investigação de locais de crime -, repetem-se a um ritmo alarmante e de noite para noite – para criar a ideia de que saímos diariamente com as personagens para proteger a cidade -, procurando expandir uma campanha que seria muito mais curta e até mais divertida se não existisse esta necessidade em expandir artificialmente o que já não é apelativo a nível mecânico. Arkham City, em 2011, já havia encontrado o formato perfeito para Batman e a sua família: missões principais e secundárias que seguem a progressão lógica da narrativa, com a possibilidade de pararmos crimes sempre que queiramos, mas nunca obrigatórios e parte integrante de uma campanha que se desenrola sobre uma base repetitiva. Gotham Knights tenta fazer o mesmo, as influências estão lá, mas atribui a estes momentos uma certa obrigatoriedade quando para o progresso da campanha para encontrarmos pistas – nas ruas de uma Gotham sem personalidade, despida e relegada a ser apenas o palco para a ação cooperativa do jogo.

Apesar do foco na ação, fiquei desapontado com a qualidade do sistema de combate. Com quatro personagens diferentes, cada uma com habilidades e estilos de combate únicos, eu não compreendo como Gotham Knights é um dos jogos mais básicos do género. Os movimentos são lentos, com zero impacto e as combinações resumem-se à repetição dos mesmos golpes até que algo caia no chão. Existem opções que procuram adicionar algum dinamismo aos confrontos, como os Perfect Strikes – que aumentam o poder de cada golpe se pressionarmos no botão no momento correto – ou os desvios que podemos combinar com um contra-ataque, mas a velocidade é um problema e o ritmo nunca chega a ser satisfatório. Parece que estamos em câmara lenta. A WB Games Montreal tentou criar uma dinâmica de combate diferente ao adicionar uma opção de ataque à distância, com cada personagem a servir-se de projéteis para interromper ataques inimigos ou para atordoar grandes grupos, permitindo-nos continuarmos a atacar ou então a encurtar a distância para podermos disferir o golpe final. As habilidades são funcionais e servem o propósito de atacarmos rapidamente um inimigo ou então o grupo inteiro, existindo sempre um período de espera até que possamos utilizá-la novamente, mas o sistema de combate sofre ao relegar a maioria das suas opções para o final da campanha – e para as horas de evolução que temos de perder até desbloquear as armaduras, armas e atributos que injetam alguma liberdade na jogabilidade.
Como Gotham Knights quer distanciar-se da série Arkham, a WB Games Montreal procurou criar um sistema de combate familiar, mas suficientemente diferente do que vimos anteriormente para evitar comparações. As comparações, no entanto, são inevitáveis por a base ser igual – atacar, desviar, controlar grupos de inimigos, utilizar ferramentas -, com a diferença que não existe um foco tão acentuado no contra-ataque. Não existe, por exemplo, uma opção de defesa, apenas de desvio, o que faz com que os confrontos tenham um ritmo irregular e insatisfatório, no sentido em que passamos a maioria do tempos a evitar golpes e não a atacar diretamente os inimigos. Isto significa que as combinações são constantemente interrompida e não enaltecidas pelo contra-ataque, uma agravante para um sistema de combate que já é construído sobre uma base tão tremida como esta. Golpes repetitivos, inimigos pouco inteligentes e uma jogabilidade demasiado dependente na construção de novos equipamentos e de um sistema de evolução muito lento criam um jogo funcional, mas pouco divertido.

A furtividade continua a fazer parte da fórmula, mas não como no passado. Como corremos poucos riscos ao sermos descobertos, visto que os inimigos não são muito inteligentes e habilidosos, não encontramos grandes motivos para esconder-nos nas sombras à procura de caminhos alternativos longe da visão dos nossos adversários. De facto, fui muito mais destemido em Gotham Knights: se fosse apanhado, paciência. Penso que este problema nasce da maior abertura dos mapas e níveis do jogo, ao contrário dos títulos da Rocksteady, que apresentavam um protagonista tão temível, como frágil a certos tipos de ataques. Como o mapa de Gotham tem de conciliar vários tipos de missões e repetir alguns dos seus confrontos ao longo da campanha – para complementar o modo cooperativo e justificar a exploração em conjunto em qualquer momento da história principal -, as abordagens são reduzidas, não há espaço para um level design mais apurado e centralizado na experiência furtiva. É o problema de tentarmos sermos o mestre de tudo: há sempre algo que cede. A WB Games Montreal tentou combater isto ao adicionar desafios adicionais às suas missões, com a recompensa de obtermos mais pontos de experiência e recursos ao completarmos estas tarefas, mas não existem grandes motivos para nos preocuparmos com estes objetivos secundários quando o jogo atira regularmente novos baús e confrontos secundários para resolvermos.
Gotham Knights é um jogo funcional que peca ao tentar ser tudo menos aquilo que deveria ter sido: uma campanha capaz de se erguer sem a sombra de Batman e Bruce Wayne, apenas pela força das suas personagens, narrativa e mundo à sua volta. A WB Games Montreal tentou criar algo diferente, mas sempre familiar e esse foi outro dos seus erros. As comparações entre a série Arkham e esta nova aventura fazem-se sozinhas – seja no design da cidade, na estrutura das missões e até nas ausências mecânicas no sistema de combate. Gotham Knights parece ser um jogo incompleto, um projeto atirado para os tubarões porque não havia mais recursos para o polir, destinado a ser relembrado como uma oportunidade falhada. Uma bolacha sem sal, onde nem sequer há a possibilidade de colocar manteiga, geleia ou qualquer outro acompanhamento. Que horror.
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