Uncharted: Legacy of Thieves Collection | GLITCH REVIEW

Dentro de poucos meses, Uncharted 4: A Thief’s End irá celebrar o seu sexto aniversário. Foi em maio de 2016 que recebemos a última aventura de Nathan Drake, uma despedida forte e agridoce, marcada por problemas de produção — que levaram à saída de Amy Hennig, diretora e guionista da série — e uma mudança de tom e escala que representaram não só uma nova direção, como a passagem para a anterior geração de consolas, de pé afincado na alta definição e numa capacidade de processamento impossível nos títulos anteriores da série. Seis anos é um abismo nos videojogos. Nestes 72 meses, recebemos alguns dos melhores títulos das últimas décadas, vimos a chegada de novas consolas e a ressurreição da Realidade Virtual, e, apesar deste progresso necessário, há algo de familiar e reconfortante numa aventura clássica, bem representada e assente num ritmo controlado, mas empolgante como a série Uncharted. Apesar dos seus problemas, esta coleção, que reúne também Lost Legacy, é uma deliciosa lembrança do passado recente e do quão especiais foram as aventuras de Nathan Drake, que teimam em resistir ao teste do tempo.

De facto, revisitar Uncharted 4: A Thief’s End é sentir finalmente a ausência da popular série no catálogo atual da Sony e digo-o de coração cheio. É preciso perdermos algo para lhe darmos valor, é aqui que a sabedoria tradicional consegue sempre estar um passo à frente: é a verdade. Apesar de apresentar uma campanha mais extensa, muito mais focada nas personagens e na viagem pessoal de Nathan Drake, tal como uma análise da sua relação com Elena e o seu irmão Sam, a Naughty Dog conseguiu criar alguns dos momentos mais memoráveis da série ao evoluir a fórmula timidamente, mas sempre onde mais necessitava. Os puzzles são cinemáticos, as sequências de ação mais raras, mas marcantes e temos uma refrescante aposta na exploração que culmina na viagem até Madagáscar, onde exploramos uma savana extensa com Sam e Sully.

Depois temos o combate e o design dos níveis, agora mais verticais graças ao gancho de Nathan Drake. Não é a mecânica mais versátil do catálogo da Naughty Dog, que só pode ser utilizada em locais muito específicos dos cenários, mas é o suficiente para mudar o ritmo dos combates e oferecer aos jogadores uma maior mobilidade em campo. A estrutura dos confrontos continua idêntica, como seria de esperar, com espaços muito amplos, mas restritos a coberturas e zonas de esconderijo que procuram dar aos combates um ritmo mais fluído. O gancho suaviza este para-arranca tradicional dos jogos de ação na terceira pessoa, pedindo aos jogadores que mudem constantemente de esconderijo para encontrarem um ponto de vantagem. A IA também reflete estas escolhas, tentando constantemente cercar Nathan, especialmente nas maiores dificuldades, algo que vimos ser reaproveitado em The Last of Us Part II.

Em retrospetiva, foi a evolução tímida e pouco notória que traçou o fim desta série popular, mas ao revisitar Lost Legacy, é difícil não imaginar qual seria o futuro de Uncharted caso a Naughty Dog quisesse dar continuidade à história de Nathan, Sam e Chloe. No papel, Lost Legacy não é o salto gigantesco que traço nesta análise, mantendo intacto o design que moveu praticamente todos os títulos da série, mas é refrescante pela sua dinâmica entre combate e exploração. É impossível não destacar o capítulo 4, onde, ao contrário de Madagáscar, temos um puzzle maior para desvendar e um número simpático de zonas e colecionáveis para descobrirmos. O que me surpreende mais é que não precisamos de um mini-mapa sempre presente na UI para nos guiarmos, com o design da zona mais ampla a ser fácil de ler e reconhecer através dos seus monumentos e zonas de interesse. A exploração exponencia o crescimento da amizade entre Chloe e Nadine, com a Naughty Dog a revelar a sua destreza no que toca à escrita de diálogos que conseguem atingir o equilíbrio saudável entre exposição e desenvolvimento de personagens.

A campanha mais condensada de Lost Legacy funciona como um epílogo perfeito para a série, expandindo a jogabilidade na forma como exploramos os seus níveis, mas sem nunca perder o foco na ação. Temos puzzles, cenários incríveis a nível visual e a ação exagerada e explosiva que marcou títulos como Uncharted 2: Among Thieves, onde a duração da campanha não permite que nos cansemos com nenhum dos seus elementos. O combate tem um foco interessante na furtividade, utilizando as ervas altas apresentadas em Uncharted 4, mas com o design dos níveis a surpreender pelo nível de detalhe e de diferentes abordagens presentes em cada confronto. É um jogo de ritmo, milimetricamente construído para ser uma das aventuras mais divertidas da geração passada e que aqui resiste sem problemas ao teste do tempo.

É difícil não olhar para a campanha com algum saudosismo, mas tenho de elogiar a sua escala e direção de arte. Os cenários são expansivos, repletos de detalhes e de cor, onde as várias culturas não colidem entre si, antes pelo contrário, fluem logicamente entre a beleza natural destas zonas não exploradas e os resquícios de civilizações perdidas. A narrativa visual é muito forte e sentimo-nos pequenos nestes mundos de mistério, agora em 4K e com a possibilidade de jogarmos em 60fps. Arrisco-me a dizer que estamos perante as suas versões definitivas devido à escala que o desempenho sólido e a remasterização adicionam aos cenários destes exclusivos da Sony. Sente-se a rigidez dos controlos em alguns momentos da ação, como o magnetismo das personagens — que faz muitas vezes com que nos colemos à parede mais próxima —, e a fórmula a ser esticada até ao máximo através de uma estrutura demasiado segura e sem surpresas, mas nunca deixa de ser delicioso perceber o que a Naughty Dog é capaz de fazer neste género de ação e aventura. O casamento entre jogabilidade e narrativa não é perfeito, e muito dificilmente alguma vez será, mas a produtora foi inteligente ao apostar sempre num fator importante: a diversão. E nesse sentido, estes dois jogos são exemplos máximos dessa filosofia.

O problema desta coleção está na ausência de novidades. Sem menosprezar a qualidade dos dois videojogos, que assinaram o final da saga Uncharted, a coleção preocupa-se mais em preencher os campos obrigatórios destes relançamentos ao adicionar suporte para o DualSense, que ajuda a pronunciar certas ações em jogo, como um simples escalar de parede onde sentimos os passos das personagens, e a passagem para uma qualidade de imagem que almeja os 4K. O modo de performance é outro chavão incontornável nestes saltos geracionais, mas é impossível discordar do impacto que tem na experiência de A Thief’s End e Lost Legacy, com os 60fps a darem uma nova vida às suas campanhas. O HDR ajuda a pronunciar as cores esbeltas das versões originais e há toda uma nitidez impressionante em jogo, com um desempenho muito sólido, sem soluços, onde os tempos de carregamentos foram praticamente anulados. Não existem dúvidas de que se trata da melhor versão de ambos os jogos, mas fora estas adições, não esperem mais nada.

E isto é um problema. Não estou contra o relançamento de videojogos, não sou assim tão nariz empinado, mas quando a Sony exige a reaquisição do seu catálogo, atualmente disponível a preços muito reduzidos, ou a sua atualização por 10€, é normal esperar mais. Encontrei vários bugs em Lost Legacy, por exemplo, onde objetos ficaram presos no ar, as personagens transportavam-se devido a problemas de IA e de pathfinding, e os controlos saltavam inputs sem avisos. São problemas, como podem depreender, das versões originais e não da sua conversão, o que significa que temos mais um trabalho de pintura sem uma aposta na correção de deslizes que prejudicam a experiência de ambas as campanhas.

Este é mais um aviso à navegação do que uma condenação em público, pois já sabíamos que a aposta nunca estaria nas novidades. Se já jogaram Uncharted 4: A Thief’s End e Uncharted: Lost Legacy, só vos resta revisitar as duas aventuras em 4K, ainda que a 30fps, ou a 60fps em resoluções mais modestas. Se nunca tiveram a oportunidade de experimentar este final explosivo da saga, então este é o momento perfeito. São dois dos melhores videojogos de ação e aventura que tive o prazer de jogar e não encontrei nada semelhante nestes quase seis anos desde o seu lançamento. É a Naughty Dog a despedir-se com um estrondo de uma das suas séries mais populares e foi delicioso reencontrar as personagens que nos acompanharam desde 2007. No entanto, permanece uma máxima que me recuso a afastar, por mais que adore do fundo do coração ambos os jogos. 10€ pode ser um bom preço, mas zero será sempre melhor. Uma lição para a Sony aprender no futuro.

A escala utilizada é de 1 a 10

O código para análise foi cedido pela PlayStation Portugal.

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