Aposto que isto já vos aconteceu. Alguém ofereceu-vos uma consola, a primeira que alguma vez tiveram, e não souberam o que fazer com ela. Afinal, o que é aquela caixa preta ou branca com um, ou mais comandos que pode ser ligada à televisão? Que bruxaria é aquela? Mas com o tempo, perdem o medo à eletricidade e aventuram-se pelo mundo dos videojogos. É aqui que surge a primeira grande revelação das vossas vidas: agora são Gamers™.

No entanto, novo problema. Como podem ser Gamers™ de valor em 2021? Como se devem comportar perante os vossos colegas e semelhantes? Com a chegada das novas consolas e da época natalícia, muitos futuros Gamers™ vão encontrar-se nesta situação. Para ajudar esta nova geração, temos todos os passos que devem seguir para serem os melhores Gamers™ da vossa rua; quiçá, da vossa cidade!
Jogar o mínimo
Vamos desmistificar já um dos maiores problemas: vocês não precisam de jogar ou pesquisar muito sobre videojogos. O que precisam é de escolher uma mão cheia de títulos populares e manterem-se atualizados sempre que sai um novo sucesso. Jogaram Fall Guys? E que tal Among Us? Se responderam a uma destas questões, não percebem como funciona o mundo dos videojogos: a resposta não interessa.

O que têm de fazer é partilhar memes, falar regularmente nos videojogos e assumir uma posição de defesa sempre que um desses títulos é atacado por alguém que é “claramente” menos Gamer™ que vocês. Quando a fase de popularidade do jogo terminar, algo tão incontornável como a passagem do tempo, passam para o próximo. E assim sucessivamente até ao dia em que se aperceberem que afinal não gostam de videojogos.
Escolher uma equipa
Depois de tirarem ideias erradas da cabeça, está na hora de darem o primeiro passo na vida de Gamer™. O primeiro não é, mais uma vez, jogar ou gostar de videojogos, mas sim escolher uma equipa. E que equipa devem escolher? Aquela que está sempre a ser atacada, não interessa qual. Quando escolherem a vossa equipa, ela será sempre aquela que é prejudicada pelos meios de comunicação, a vítima de todas as vítimas. Se são fãs de consolas, escolham uma das plataformas e defendam-na com unhas e dentes nas redes sociais. Se quiserem ir um passo à frente, comprem uma das t-shirts na Primark para que não existam dúvidas do vosso amor à marca.
Quando escolherem a vossa equipa, é o vosso dever moral comentar e rebaixar qualquer comentário que seja negativo ou pejorativo para a vossa equipa – até aqueles que não percebem. Alguém falou mal da PlayStation? Relembrem-nos do lançamento da GameCube. Gozaram com a falta de exclusivos da Xbox? Façam com que sejam despedidos através de assédios e ameaças de morte. É fácil!
Nunca se esqueçam de uma coisa: a vossa equipa é a melhor. No entanto, se a vossa equipa mudar a sua comunicação e elogiar as equipas rivais, numa tentativa de atenuar a desnecessária guerra de marcas, peguem nas forquilhas e relembrem-se que afinal estão sozinhos neste mundo.
Criticar quem não gosta do que tu gostas
E porquê? Porque ninguém tem o direito de criticar aquilo que vocês gostam! Vocês são as verdadeiras vítimas, os atacados e menosprezados pela sociedade que têm de lutar para serem ouvidos. Para tal, é necessário encher comentários com todo o vernáculo possível e com a eloquência de um poeta experiente. Algo como “Lol mata-te” ou “Estás errado” são trunfos na manga de todos aqueles que adoram uma boa discussão e contra-argumentação. Não se esqueçam: são vocês que estão certos.

Mais uma vez, não interessa se compreendem o tema ou o videojogo que está a ser discutido. Se alguém menciona que jogo X é melhor que o jogo Y, sendo que Y é o vosso favorito, não importa os argumentos que usaram: são alvos a abater. Se continuarem a ser perseguidos pela “gentalha” que defende aquele videojogo horrível, não se esqueçam de usar tiradas como “A tua mãe é que é má” ou “Foste buscar os teus amigos para me atacarem? Aqui é que se vê quem é o melhor. Que vergonha”.
Não ler nada: tudo é mentira (menos aquilo que o meu primo disse)
O vosso primo, ou prima, é a pessoa mais informada do planeta. É aquele indivíduo que leu revistas quando a imprensa ainda era em papel e que sabe mais do que qualquer outra pessoa, jornalista e jogador que alguma vez conheceram. “Estou-te a dizer que é assim” é uma das frases mais importantes que irão ouvir na vossa vida e que é tão poderosa, tão marcante e importante que até em tribunal é viável.
Se há coisa que o vosso primo sabe é que os jornalistas e críticos são todos uns mentirosos. Não sabem nada, não são verdadeiros Gamers™ e não conseguem jogar o videojogo mais simples deste planeta. Então os jornalistas deram uma boa nota àquele jogo que o primo diz que é uma seca? Aqueles tipos são mesmo uns inúteis! Até aposto que nunca jogaram Dark Souls e que só gostam de Call of Duty!
Para protegerem a vossa reputação, não devem ler nada que venha de um site de videojogos. Se é um crítico profissional, é de evitar. Não interessa os anos de carreira que tem ou a sua experiência, de certeza que é um vendido. Se quiserem saber mais, falem com o vosso primo que ele vai aconselhar-vos uns canais de YouTube que valem muito a pena, daqueles que poucos conhecem, mas que alimentam o vosso ego diariamente com ódio – peço desculpa, com argumentação e bom-senso – e unem toda uma comunidade à sua volta.
Vocês não precisam de expandir os vossos horizontes, mas sim ficar no vosso círculo de amigos e conhecidos que têm sempre a mesma opinião que a vossa. Sabem porquê? Porque lá fora existe um bicho mau e destrutivo que ameaça a vossa vida. E esse bicho chama-se… política.
Não são políticos, mas…
Se há coisa que vão odiar não é a crescente exploração dos designers na produção de videojogos ou a xenofobia com que vivem milhares de jogadores por todo o mundo, mas sim a insistência das produtoras em injetarem ideologias políticas nos videojogos! Porque, bolas, os meus videojogos nunca foram políticos e não é agora que o vão ser!
A política deve estar fora dos videojogos – e vocês sabem isso (também foi o vosso primo que vos disse). Mais personagens afrodescendentes? Protagonistas femininas? Isto só pode ser política e vocês, que são Gamers™ atentos, já apanharam as modas destas companhias que não respeitam o vosso tempo e dinheiro. Aliás, só querem que os videojogos sejam mais realistas, sem personagens que não sejam mais escuras ou mais claras que um pladur, tal como a realidade é e sempre foi.
“Go Woke, Go Broke” deve ser tatuado o mais depressa possível nas vossas costas à medida que vêm a política a matar as séries que tanto adoram. The Last of Us precisava de personagens transexuais? É óbvio que não e todos precisam de ouvir isso! Não interessa que o videojogo tenha sido um sucesso comercial, crítico e considerado como um dos melhores videojogos desta geração, a política matou o Joel! UM HOMEM!
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E quero sublinhar: vocês não são políticos, mas realmente apreciam a ideia de uma Civilização Ocidental protegida e de valores afincados. Não são políticos, como é óbvio, mas a vossa liberdade de expressão é o elemento mais importante na história ocidental. Isto da política é para fora dos videojogos!
E aqui estão os passos simples para serem os melhores Gamers™ de sempre. Agora peguem nos vossos comandos e teclados, pousem-nos na secretária e vão para os fóruns mostrarem aos outros como são mais Gamers™ que eles. Que orgulho!