The Elder Scrolls: Blades é Um Jogo Bizarro

Depois do lançamento no iOS e Android, The Elder Scrolls: Blades chega à Nintendo Switch sem fanfarra ou promessas. O RPG, que desafia a definição do género, parece ter sido atirado aos lobos por uma Bethesda que está pouco ou nada interessada no seu sucesso, como um filho que desaponta, uma vez mais, os seus pais com as más notas na escola. Assim é Blades, um produto estranho, bizarro e que revela o quanto a série The Elder Scrolls está destinada, nos próximos anos, a um trajeto pouco saudável.

O trailer já revela a natureza e o público alvo deste spin-off.

O que é, afinal, The Elder Scrolls: Blades? À primeira vista, é um RPG de ação com elementos de construção e personalização de cidades, onde o foco se mantém na exploração de masmorras, na resolução de missões secundárias e na evolução e melhoramento das nossas personagens. É, até certo ponto, uma versão light da experiência de Skyrim, contando com um sistema de progressão composto por habilidades, magias e atributos que podem ser adicionados à medida que crescemos de nível para nível. A reconstrução da cidade, atacada pelas forças da Bloodfall Queen, é um dos destaques do jogo e procura dar aos jogadores a possibilidade de melhorar e aumentar os edifícios, com novas habitações e com a possibilidade de melhorar, ao longo da campanha, as suas fortificações.

No entanto, The Elder Scrolls: Blades não é muito bom a ser um RPG. Na verdade, parece ter copiado, e mal, o trabalho do seu irmão mais velho, neste caso Skyrim, e imitado sem qualquer discernimento. A jogabilidade, que foi ligeiramente trabalhada da versão mobile – onde funcionava quase como um point and click –, procura criar uma ponte entre uma experiência mais leve e as mecânicas tradicionais da série, desde o combate à exploração. Mas não é isso que temos em Blades. Na verdade, a Bethesda tentou, ao máximo, encobrir a verdadeira natureza do jogo e fazer-nos pensar que este era, para todos os efeitos, um novo The Elder Scrolls disponível gratuitamente na Nintendo Switch, quando, na verdade, é uma máquina de loot boxes, de tempos de espera e de missões secundárias sem qualquer profundidade.

Existem, como seria de esperar, vários equipamentos e armas à nossa disposição, mas fora os efeitos elementais, mal sentimos o seu peso em combate. No entanto, devemos sublinhar a presença de pontos fracos e fortes em cada tipo de inimigo.

O foco não está na aventura, na personalização da personagem ou na estória multifacetada de Blades, mas sim no seu sistema intrínseco de itens para venda e de uma mecânica de construção que está selada atrás de tempos obrigatórios de espera. Blades tenta equilibrar as suas duas faces, de RPG e de extorsão, mas sem efeito. Se durante as primeiras horas há, certamente, a ilusão de que estamos perante um novo The Elder Scrolls, um spin-off eficaz e divertido, rapidamente nos apercebemos que não é suposto jogarmos como se estivéssemos num RPG, mas sim numa máquina de fazer dinheiro. Depois da introdução, qualquer ação no jogo requer tempo, tempo esse que requer dinheiro, e dinheiro esse que requer que abandonem o mais depressa esta rota da seda.

Temos, no entanto, de nos relembrar que Blades foi pensado para o mercado mobile, onde estas mecânicas são mais prevalentes, mas não consigo fechar os olhos ao desvirtuamento da série e da sua experiência RPG. A exploração é muito limitada, com o jogo a apresentar uma mão-cheia de masmorras que se repetem infinitamente, e o combate é demasiado simples, relegando-se a um ataque rítmico, à defesa e à utilização de magias e ataques especiais; sem estratégia ou sensação de urgência. Os combates ou são fáceis, ou impossíveis, focando-se demasiado no nível de cada personagem sem existir a possibilidade de mudarmos o rumo de cada confronto. Mesmo numa plataforma mobile, Blades parece não fazer um bom trabalho e estes problemas tornam-se ainda mais evidentes na passagem para a Nintendo Switch.

Para além da reconstrução, é possível decorar a cidade e dar-lhe alguma personalidade.

Seria impossível pensar na presença de um mapa aberto em Blades. Não esperava a experiência tradicional, pura e dura, da série, mas a falta de criatividade nas masmorras é um problema intrínseco à campanha. Há uma ausência de profundidade criativa e mecânica no jogo. Mesmo sendo gratuito, esperava-se mais do combate, da variedade de puzzles e das suas personagens. Para além da campanha, podem contar com um modo PVP e com Abyss, uma masmorra mais extensa, dividida por níveis e com uma dificuldade crescente, que esconde alguns dos melhores itens do jogo. A diversão nestes modos é, como podem prever, limitada.

No geral, Blades é aborrecido, básico e sem um pingo de estratégia no seu corpo em decomposição. É uma sombra, um simulacro, de algo maior e melhor, mas devo admitir que existiu, por momentos, uma sensação de esperança. Talvez fosse a minha sede e vontade por reencontrar a experiência The Elder Scrolls na minha Switch, mas senti que estava a descobrir um jogo mais focado na ação, nas missões rápidas e com uma maior aposta na personalização do que antevia. Apesar da limitação dos cenários, senti que estava a experienciar uma versão destilada do que vira em Skyrim e Oblivion, existindo uma vontade sincera em explorar. A ideia de reconstruir uma cidade também foi aliciante, ainda que demasiado básica, e quis descobrir as vantagens e desvantagens de construir determinadas habitações; até que me apercebi que era quase aleatório. A motivação estava lá, mas o véu caiu e rapidamente descobri a bizarria por detrás deste título gratuito.

Existem magias e ataques especiais, mas no geral, o combate resume-se ao ataque sucessivo de golpes rápidos.

A presença de loot boxes era inevitável, mas sinto que Blades é demasiado invasivo. Na passagem para a Switch, o tipo de publicidade, de anúncios forçosos e de exposição a materiais para venda devia ter sido reduzido. Os menus, que são simples e pouco imaginativos, estão focados não no jogador, mas sim na possibilidade desse jogador comprar algo. O próprio tempo de espera, que é ativado sempre que construímos algo, está associado à venda de itens, algo que, mais uma vez, revela a sua natureza mobile. Mas tudo isto é bizarro, completamente dissociado da série The Elder Scrolls, transformando-se num monstro sem foco ou explicações; tal como Fallout 76.

A Bethesda parece estar disposta a experimentar e a reinventar as suas franquias, mas estou a verificar uma vontade em seguir modas e práticas da indústria, e não uma vontade sincera em inovar e em transformar as suas séries. Parece que está a perder propositadamente a noção e natureza das franquias para forçar novos géneros e modelos de lançamento/rentabilidade. Podemos dizer que há um esforço em equilibrar os dois, já que Blades continua a ser um RPG de ação com fortes inspirações em Skyrim, mas quando nos aproximamos e analisamos a sua jogabilidade e estrutura, percebemos que não é verdade. É um monstro de Frankenstein sem alma.

Não são os gráficos que me desiludem, mas sim a sua falta de direção de arte cuidada.

Então, porquê Blades? Porquê Fallout 76? Porque são pontes fáceis. As duas séries estão longe de regressarem ao PC e consolas, e estes spin-offs são divergências que procuram encurtar o tempo de espera e chegar a um novo público. A Bethesda não está apenas interessada nos fãs, como Fallout Shelter demonstrou, mas sim num novo tipo de jogador que esteja disposto a gastar dinheiro, habituado ao modelo Pay to Win do mercado mobile. E é por isso que Blades é bizarro. Existe espaço para melhorias e há uma tentativa clara em adaptar a série a um formato que lhe era estranho, mas falta-lhe alma e criatividade. É um jogo perdido entre géneros, plataformas e design.

The Elder Scrolls: Blades é tão estranho que se torna interessante analisar e depenicar. Não sei se será um sucesso junto dos jogadores da Nintendo Switch, mas o seu formato gratuito irá certamente chamar a atenção daqueles que procuram uma experiência RPG mais leve; como a mim. No entanto, a cada hora que jogava mais me apercebia que não existia nada para descobrir e ver. É um jogo vazio, pouco interessante ou desafiante. É um espirro no vento; daqueles cujas gotículas acabam por cair diretamente na nossa cara. Assim é Blades.

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