Depois da antevisão a Marvel’s Spider-Man, eis que chega a altura de nos sentar-mos a conversar com Jon Paquette, principal argumentista do jogo que chega, em exclusivo, à PS4 em setembro.
Sob o sol de agosto, o profissional, que também trabalhou em títulos como Sunset Overdrive ou Resistence 3, desvendou ao GLITCH como foi a aventura de criar um novo Spider-Man, quais são as principais dificuldades que um escritor de videojogos experiencia e qual seria o seu projeto de sonho.
De que forma este novo Spider-Man difere dos anteriores?
Há algumas diferenças. Antes de mais, quisemos tornar o Peter mais experiente nesta cidade. Tem 23 anos, já faz isto há algum tempo e sente-se confiante na pele de herói. Sentimos que esta história ainda não tinha sido contada e é aqui que reside a maior diferença. Além disso, estamos muito entusiasmados com o facto de os jogadores poderem experienciar a história através de várias perspetivas – como é o caso da Mary Jane, que é uma personagem jogável.
Recentemente fizeste um tweet no qual confessaste que este foi o jogo mais trabalhoso da tua carreira. Podes dizer-nos o momento mais divertido, e também o mais difícil, no processo de desenvolvimento/escrita?
A mais divertida… vou dizer-te o que me veio imediatamente à cabeça: um dia, antes de sair para o trabalho, o meu filho perguntou-me ‘hoje vais ver o Spider-Man, pai?’ e, noutro, algo como ‘hoje, no trabalho, vais ver tipos maus’? E isso foi muito divertido. Quanto à parte mais difícil, e novamente contando o que me vem primeiro à cabeça, foram os momentos ao fim de semana, em que era preciso trabalhar, e o meu filho estava na divisão ao lado, a querer brincar com LEGOS comigo.
O universo Spider-Man está estabelecido e é mundialmente conhecido. Como foi o processo de escrever esta história, com isso em mente, mas também com o objetivo de fazer algo original e fresco?
Na equipa somos todos fãs do universo. No início, apenas pesquisámos – lemos os comics todos, vimos os filmes e jogámos os jogos. Depois, tentámos esquecer tudo. Não queríamos fazer algo específico, mas encontrámos algumas tendências e partes muito importantes da história de Peter Parker. Por isso, trabalhámos de forma independente a nível criativo, mas tendo em conta os elementos e temas que são precisos para criar uma boa história de Spider-Man.
Sentiste algum tipo de protecionismo por parte da Disney, por exemplo?
Não. Foram todos espetaculares connosco. O filme Spider-Man: Homecoming foi lançado durante o processo de desenvolvimento do nosso jogo e dei por mim a pensar ‘oh não! e se eles nos roubam algumas ideias?’ [risos]. Mas não importa. Na verdade, é uma versão totalmente diferente do Spider-Man e esperamos sinceramente que as pessoas fiquem entusiasmadas com o que criámos.
Qual é o teu vilão preferido do universo Spider-Man?
O meu vilão preferido aparece no jogo, é o Martin Li, Mister Negative. Na verdade, não sabia muito sobre ele até começar a trabalhar neste projeto. Uma das coisas que realmente pretendemos com este jogo é contar uma história na qual os universos de Peter Parker e Spider-Man colidem – essas são sempre as melhores histórias. Martin Li é um exemplo disso: tem este lado simpático, filantrópico, de alguém que gere um abrigo para carenciados, mas, depois, também se transforma num vilão. E essa história é muito fixe e tem exatamente o mesmo tema do que a do Peter vs Spider-Man. Ambos têm de gerir os alter-egos. É quase uma novela.
Qual é o maior desafio que um escritor de videojogos enfrenta?
Muitas das coisas que fazemos deitamos fora. Reescrevemos muito. Na verdade, o processo de desenvolver um jogo não é só ‘escrever um guião e pronto’. O que fazemos é escrever, testar e, se não assentar bem, escrevemos outra coisa, voltamos a testar e assim sucessivamente. O que também acontece muito é que, ao longo do desenvolvimento, surgem novas funcionalidades e temos que adaptar a narrativa rapidamente. Chega alguém e diz ‘trabalhei no fim-de-semana para criar este gadget’ e nós temos que perceber de que forma este objeto se insere na história, como é que o Peter desenvolveu a tecnologia, por aí. Penso que, para a maioria dos escritores de videojogos, o maior desafio é sentir que nunca se terminou o trabalho até o jogo estar realmente finalizado. Muitas pessoas perguntaram-me, no início da produção, “Ah, então já acabaste a história, não é” e a minha resposta era sempre “nem por sombras!” [risos].
Qual é a tua opinião sobre o estado atual das histórias/narrativa nos videojogos?
Estou muito entusiasmado com a indústria neste momento. Temos uma audiência suficientemente grande para podermos apoiar, em simultâneo, jogos AAA e indie, sendo que, nestes últimos, temos profissionais a arriscar em termos de narrativa – há alguns jogos que adorei nestes últimos tempos, como é o caso de What Remains of Edith Finch. São jogos feitos por equipas pequenas, mas que exploram os videojogos como um meio, de uma forma diferente daquilo que é feito em jogos maiores. Penso que o storytelling vai continuar a evoluir e nós, como escritores e produtores, vamos continuar a encontrar formas novas e diferentes de utilizar as ferramentas que temos para contar histórias e interagir com os jogadores.
Qual seria o teu projeto de sonho? Liberdade total, zero constrangimentos financeiros ou criativos.
Spider-Man, sem dúvida. Quando era novo, tinha subscrições de comics e era muito fã de Spider-Man. Mais tarde, quando estava a estudar argumento, disse a mim mesmo, ao ver, acho, o primeiro filme de Spider-Man, sei que atingi o pico como argumentista quando fizer um filme do Spider-Man. E aqui estamos. Na verdade, este jogo deu mais trabalho do que um filme – se juntarmos todas as cut-scenes, tem a qualidade e duração de um filme. Por isso, é mesmo um sonho tornado realidade.